terça-feira, 5 de agosto de 2008

Eleições Virtuais, Parte II - A missão

Talvez meu artigo anterior, sobre o uso da Internet nas eleições não tenha sido o mais lido, mas certamente foi o que mais motivou respostas dos leitores ou melhor dizendo... e-leitores.

Até por telefone recebi elogios e críticas, assim como assessores me ligaram pedindo alguma informação ou querendo corrigir algo que eu tenha dito e como não podia faltar, não faltou quem dissesse que estou equivocado ao afirmar que as urnas eletrônicas podem ser fraudadas.

Pois que seja, se o presidente do TSE vai a TV dizer que não podem então que se diga amém a suas palavras e fica o dito pelo não dito, embora minha opinião não mude, mas que fique repetido: segundo o supremo ministro as urnas não podem ser fraudadas e fim-de-papo.

Mas voltando aos níveis menos supremos da vida e atendendo a algumas consultas que me foram feitas e talvez eu não tenha podido responder da melhor forma, vou comentar sobre alguns itens.

INTERPRETANDO A LEI

Tá lá na lei, mais especificamente na resolução 22718, cujo link informo para facilitar a busca:

http://eleitoral.pgr.mpf.gov.br/eleicoes-2008/docs-2008/res22718.pdf

No que diz respeito a Internet, as disposições estão no capítulo IV.

O artigo 18 deste capítulo informa o seguinte:

Art 18. A propaganda eleitoral na Internet somente será permitida na página do candidato destinada exclusivamente à campanha eleitoral.

Se entendermos isso ao pé-da-letra é o mesmo que dizer que não pode fazer propaganda em nenhum outro lugar da Internet e isso incluiria Orkut, Youtube e outros tantos locais, que evidentemente não estão na página do candidato.

Curiosamente o artigo seguinte diz:

Art. 19. Os candidatos poderão manter página na Internet com a terminação can.br, ou com outras terminações, como mecanismo de propaganda eleitoral até a antevéspera da eleição (Resolução nº 21.901, de 24.8.2004 e Resolução nº 22.460, de 26.10.2006).

Ou seja, pode ou não pode ter página com outra terminação?

Num artigo diz que sim, no outro diz que não.

E o que – exatamente – é fazer propaganda eleitoral? Será que citar o endereço do site de um candidato é propaganda eleitoral? Neste caso citar um endereço de site de um candidato em meu email configuraria quebra desta lei?

São questões muito subjetivas e se perguntar a 10 juizes provavelmente teremos 10 respostas diferentes.

Para evitar problemas com isso uma boa parte dos candidatos está preferindo esquecer a Internet, acham que se não chegarem perto de um site, de um endereço de email ou mesmo de um computador estarão livres de dissabores e muitos acham que farão uma boa economia na campanha pois julgam que usar a Internet é algo muito caro e me parece que este será o ano dos candidatos que não vão gastar muito pois olhando a declaração de bens de muitos deles descobrimos algo bastante estranho, alguns não tem qualquer bem, vamos esperar que – se eleitos – saiam do mandato do mesmo jeito.

As maiores dúvidas são com relação ao que se pode ou não pode fazer, alguns candidatos dizem que é expressamente proibido enviar email para seus eleitores mas onde estaria esta recomendação, procurei em todas as leis que pude encontrar e nenhuma informa isso especificamente. Tudo é questão de interpretação.

Continuando a interpretar – como leigo, naturalmente - a resolução do TSE chegamos a outro artigo, o 19, que não vou repetir mas explico com facilidade:

Esta resolução afirma que os candidatos tem direito a registrar gratuitamente um domínio no orgão gestor da Internet no Brasil. Seria um domínio com a terminação .can.br, precedido pelo nome+número do candidato. Ou seja, o candidato Fulano, cujo número fosse 12345 teria direito ao seguinte endereço na Internet: www.fulano12345.can.br.

Muito bacana, fácil de lembrar e ao mesmo tempo já facilita lembrar o número do candidato, mas será que isso vai REALMENTE funcionar?

São mais de 300 mil candidatos em todo o Brasil e até o momento informações na imprensa informam que apenas 25 mil nomes teriam sido registrados, muito embora uma pesquisa simples no Google demonstre que os números são bem menores.

O site www.registro.br na área de estatísticas informa a quantidade de domínios para todas as terminações, menos para .can.br, já solicitei que informem o número exato e estou aguardando.


Nota: Os responsáveis pelo Registro Br enviaram um email informando que não disponibilizam esta informação. Pensei em perguntar porque mas imaginei que se quisessem esclarecer já teriam dito. Então fica assim: não enviam porque não querem.
Uma das razões de não termos tantos sites .can.br é que o TSE também permitiu que os candidatos mantivessem outras denominações de site, ou seja, o .can.br passou a ser opcional. Mas neste caso voltamos ao artigo 18 e 19 da resolução 22718, pode ou não pode?

As regras mudam da noite para o dia, ou de acordo com o amadurecimento dos técnicos do TSE, afinal a Internet tem “apenas” uns 13 anos, fica parecendo que o TSE entende que ela ainda não está na idade de participar das eleições.

Um dos políticos com quem conversei informou que a campanha só começa de verdade após o dia 15 de Agosto... interessante isso, será que todos combinaram uma nova data?

E a resolução nada mais diz, naturalmente temos a lei 19504, de 1997- que ainda chama site de sítio – mas tudo que ali está, pode-se dizer que já caducou.

O QUE PODE, O QUE NÃO PODE?

Pode escrever no Orkut? Pode colocar foto no Flickr? Pode colocar vídeo no YouTube?

Todos acham que não, mas onde é que está escrito isso?

E se um espectador decide filmar um candidato e colocar no YouTube, o candidato será punido?

São questões que deveriam ser simples, mas não são e o motivo é um só, o TSE não sabe realmente o que fazer com a Internet e com isso as eleições de 2008 serão caracterizadas justamente pelo medo.

Não pode servir comida, ou seja, ou os candidatos e seus correligionários terão que comer escondidos em algum lugar ou correm o risco de ser flagrados perto de um prato de feijão e acharem que está promovendo uma feijoada.

E como fica o vendedor de churrasquinho? O pipoqueiro? Serão retirados pela polícia?

Quem perde com isso não é o candidato, que acaba fazendo economia, mas legislar sobre o churrasquinho me parece querer ir muito além da competência do legislador.

Se não pode escrever no Orkut então danou-se, melhor fechar o Orkut de vez pois não tem fiscal ou juiz que vá impedir que comunidades oficiais ou não proliferem por lá e que o assunto principal seja o candidato político. O mesmo vale para outros serviços públicos e populares, não há como impedir e tampouco qualificar quando houve abuso da parte do candidato ou seus representantes, mesmo porque é estupidamente fácil forjar algo parecido com um abuso e neste caso criamos a situação em que o candidato é culpado até prova em contrário, invertendo uma regra elementar do direito;

E o SPAM?

Se começar a receber uma chuva de mensagens VOTE NO FULANO, vai parecer que o FULANO perdeu a cabeça e pimba... multa nele, desclassificação e tudo mais.

Mas como saber quem fez a patuscada?

Me desculpe quem achar o contrário, mas não tem como. Há mil e uma maneiras de se simular que alguém ligado a um candidato ou o próprio saiu fazendo SPAM.

Qualquer pessoa também pode criar um website, associar a um nome de candidato e criar problemas para este. Como o tempo das eleições é curto, até provar que focinho de porco não é tomada a eleição poderá estar comprometida.

CONCLUSÕES

Até hoje encontro quem não confie em usar Bank Line e já me deparei com diversas situações onde a fraude ocorre justamente porque o cliente de um banco não registrou sua senha eletrônica, pois isso facilita muito a fraude, é mais difícil invadir uma conta que tenha seus registros eletrônicos definidos do que uma conta que ainda não os tenha, não vamos entrar no mérito desta questão, mas faço a analogia justamente para esclarecer que seria mais difícil criar um problema para um candidato que tenha seu site oficial do que para um que não o tenha.

Um site falso de um candidato não terá vida longa se existir o site verdadeiro, mesmo porque o internauta sabe procurar, sabe pesquisar e havendo o site real ele será encontrado.

Continuo defendendo a tese de que se o TSE quer REALMENTE verificar o que o candidato está fazendo deveria simplesmente assumir todo o controle do processo, gerenciando os sites e as ferramentas necessárias ele mesmo, não permitindo que candidatos utilizem outros meios que não sejam os ali disponibilizados e fazendo a necessária divulgação disso.

Nada impede que o TSE faça acordo com os serviços mais conhecidos, como sites de blogs, de fotos, de vídeos e defina acordos que permitam seu uso por um representante dos candidados, devidamente autorizado e identificado, tal como já ocorre junto ao Registro.br, onde é necessária a criação de uma identificação para usar o serviço.

Se fosse feito desta forma, os excessos ocorreriam em menor quantidade e seriam mais fáceis de serem identificados.

Na prática o TSE já faz este serviço, pois coloca no ar um mini-site contendo foto, nome e outras informações do candidato, mas esquece do principal, que é o mesmo que os candidatos estão esquecendo, que a Internet é uma mão de duas vias.

A diferença principal da Internet em relação a TODAS as outras mídias (exceto telefone) é que o participante não é passivo, o internauta não tem apenas que receber o “santinho” do candidato e dizer amém, ele tem o direito de poder perguntar de volta.

Nesta eleição, candidato que não colocar seu email ou site na propaganda nem terá minha atenção, para mim nem existe pois se quando pede meu voto não está disponível para responder as perguntas ou efetuar um contato é evidente que depois de eleito vai estar ainda menos disponível, como alias tem ocorrido com praticamente todos que dizem nos representar, só aparecem para pedir voto.

Outro dos políticos com quem conversei disse que nem sempre a resposta é dada pelo candidato, que muitas vezes alguém responde em nome dele. Bom, eu digo que se alguém responde em nome dele é porque ele autoriza e que esta pessoa o representa.

O mundo virtual ainda precisa ser compreendido e creio que falta ainda uma geração passar para começar a ser utilizado de verdade. O fato é que em 2008 acredito em alguma renovação no processo e uma delas é a exigência de que o nosso representante pelo menos entenda que a Internet veio para ficar e ser usada e não apenas para enfeitar cartões de visita e muito menos santinhos.