terça-feira, 12 de agosto de 2008

História da Informática no Brasil - Parte 5A

O INCRÍVEL SINCLAIR

Sir Clives Sinclair, um inglês nascido em 30 de Julho de 1940, deixou seu nome várias vezes na história da tecnologia.

Mas o que teria um inglês a ver com a História da Informática no Brasil?

Muito, pois foi com uma das invenções desta espécie de Professor Pardal que muitos dos brasileiros começaram sua história na informática.

Eu sou um deles.

Desde que me lembro por gente eu ouvia falar nos “cérebros eletrônicos” que depois passaram a se chamar computadores e mais tarde computadores pessoais.

Conforme já falei, tenho a mesma idade que Bill Gates e ao ler sua biografia descobri que tínhamos muita coisa em comum mas aos 12 anos ele teve contato com seu primeiro computador, um equipamento de 50 mil dólares que praticamente só ele e Paul Allen (o cérebro informata por trás do cérebro marqueteiro do Bill) tiveram interesse em usar.

Não que se eu tivesse acesso a um equipamento do tipo aos meus 12 anos eu iria me tornar um Bill Gates, mas com certeza teria conquistado algumas coisas a mais.
Só que com mais de 20 eu ainda não tinha sequer visto um computador na minha frente, na verdade já tinha sim, afinal vídeo- games são uma espécie de computador, mas nem disso eu sabia.

Até que por obra do destino, um computador acabou caindo em minhas mãos, justamente o Timex Sinclar 1000, a versão norte-americana de uma das obras mais fantásticas do Tio Clive (eu chamo ele de Tio sim, se me permitem ).

Sinclair não inventou o computador, mas podemos dizer que o reinventou, pois fez um dos mais enxutos, funcionais e baratos computadores de todos os tempos, uma pequena maravilha tecnológica que custava apenas 100 dólares, um preço realmente absurdo (muito barato) para a época em que foi lançado, ou seja, no início dos anos 80, na verdade um pouco antes.

O ZX81

Baseado no micro processador Z80 (que atualmente desempenha funções bem menos nobres) seu pequeno computador fazia milagres, era possível rodar programas tais como editores de texto, planilhas, banco de dados e jogos – muitos jogos – em apenas 16 Kb de memória, algo que nos dias de hoje deve parecer absurdo a quem costuma lidar com terabytes de memória e acha pouco.

Na verdade, o primeiro micro do Tio Clive tinha meros 2 kb de memória e decididamente não dava para fazer muita coisa com ele nesta situação, mas bastava adicionar absurdos (em todos os sentidos) 14 kb a mais e pronto já tínhamos um microcomputador pra ninguém botar defeito.

Para que se tenha uma idéia do que isso significava, um PC gasta 16 Kb apenas para se escrever uma palavra de 1600 letras, ou seja, menos que este texto inteiro e paradoxalmente eu poderia escrever este mesmo texto naquele micro e provavelmente o faria mais rápido.

A bem da verdade a pequena maravilha criada pelo Tio Sinclair só ficou realmente bom quando pode contar com absurdos 48 Kb de memória, através de mais uma expansão de 32 kb, ai ele extrapolava, mas ainda assim, 48 Kb também teriam sido gastos em um PC para escrever este único texto, na verdade no PC e em qualquer outro micro atual, se gastaria o mesmo.

Apenas a título de comparação, o Windows Vista precisa de 512 Mb de memória apenas para rodar seu SO, o SO do ZX81 e de seus predecessores cabia em meros 256 kb e já vinha embutido no hardware, não tinha que carregar nada, ligou na tomada e o prompt (cursor) inconfundível do ZX81 piscava na tela da TV.

Isso mesmo, na TV. Os micros do Tio Sinclair funcionavam em uma simples TV preto e branco e usavam um gravador K7 comum (coisa que a garotada da era MP3 nem deve saber o que é) para armazenar os programas.

Tio Clive foi de uma genialidade impar ao criar este micro, o SO era enxuto, eficiente e a única falha que poderíamos atribuir ao mesmo era a dificuldade de gravar e reproduzir os arquivos no K7, era preciso muita paciência, mas isso só ocorreu nos primeiros modelos e até para este havia soluções milagrosas que envolviam coisas que ditas nos dias de hoje não fariam sentido, tal como “regular o azimute”.

Eu explico...

Todo gravador K7 tinha um parafuso que permitia ajustar a posição do cabeçote magnético em relação ao centro horizontal da fita K7. A esta delicada relação se dava o nome de azimute, que se procurarem no dicionário, os mais curiosos vão saber o que significa. A regulagem do azimute era justamente fazer com que o centro do cabeçote ficasse perfeito em relação a gravação magnética na fita K7.

Isso era feito “de ouvido” quando mais agudo o som, melhor a qualidade da gravação.

Tio Clive não parou no ZX81, foi criando outros e outros micros mas como qualquer sonhador voou longe demais e quase acabou com a fortuna da família, suas empresas foram a falência e teve que vende-las, mesmo tendo criado um dos melhores computadores de todos os tempos.

Tio Clive está ainda em plena atividade (longa vida e sucesso a este homem excepcional) e talvez ainda surpreenda o mundo com mais criações, o sonho dele é fazer robots que tenham alguma utilidade prática para o homem comum e não duvido que seja ele o primeiro a conseguir isso.

MAS VAMOS FALAR DE BRASIL

Me perdoem, mas quando começo a falar de um assunto tão interessante é impossível não divagar e por isso mesmo tenho poucos e fiéis leitores, em tempos de textos curtos e concisos eu fico aqui divagando, mas felizmente ainda há quem goste...

Ou será que não há mais? Escrevam e me digam, por favor.

Tio Clive é importante para o Brasil porque foi justamente com suas criações que se formou uma geração dos nossos melhores gênios de informática. Qualquer um que tenha mais que 45 anos, talvez 40 e seja um usuário de informática pesado, daqueles que vão além do MSN e de navegar no Orkut, com certeza teve um micro da linha Sinclair.

Meus primeiros (e únicos) 4 jogos de computador, devidamente registrados na extinta SEI (Secretaria Especial de Informática) e vendidos na extinta Mesbla (será que também fui extinto e nem sei?) foram criados num Sinclair.

Quem procurar na Internet pela revista Micro Sistemas vai descobrir que boa parte dos nomes em evidência no mercado de informática de hoje eram meninos prodígio com seu Sinclair. Para quem quiser checar, tem quase todos os números da MS no site http://cobit.mma.com.br/biblioteca/microsistemas.htm.

Eu não era nenhum menino, tinha já meus 20 e tantos anos, já tinha servido o exército e queria fazer alguma coisa diferente, foi então que caiu o tal Timex -Sinclair 1000 em minhas mãos, mas penei durante exatamente 1 ano e quem disse que eu conseguia sequer escrever meu nome na tela....

Já estava desistindo quando um garotinho de apenas 5 anos olhou meu ZX81 em cima da mesa e disse que tinha um igual.

Putz... coloquei o pirralho no colo e ele finalmente me ensinou a escrever meu nome na tela, no dia seguinte eu já queria escrever jogos no micro.

E escrevi... tudo bem que não foi no dia seguinte, foi alguns meses depois e nem foi no Timex 1000, que só tinha os tais 2 Kb de memória e esta foi a razão de eu ter apanhado tanto, com 2 Kb o micro era muito limitado.

Comprei um CP 200, da Prológica a prestação e nele consegui finalmente fazer algo decente com um computador.

A Prológica era um dos maiores fabricantes de computador daquela época, concorrente direta da Microdigital e acima delas reinava apenas a IBM e a Cobra, sendo que a IBM dispensa apresentações e a Cobra era a empresa criada pelos militares (porque será que militar gosta tanto de cobra?) mas eles não gostam muito que se diga isso então para não chatear ninguém eu digo que a Cobra era a nossa Microsoft, mas sem o Bill Gates.

A Cobra não estava nem aí para pequenos computadores e a IBM muito menos, mas a Microdigital e a Prológica disputavam um mercado absolutamente virgem, que era o dos usuários brasileiros e de acordo com as leis da reserva tinham que fazer micros genuinamente brasileiros.

Ai entra o incrível micro do Tio Clive.

Mas não vou poder continuar, até para minha tradicional prolixidade este texto já ficou muito longo então vou fazer uma coisa que não gosto muito e continuar esta história apenas na semana que vem.

Então quem me acompanha (aguardo suas confirmações em meu email) saberá como um micrinho de 100 dólares conseguiu ser tão importante na história do Brasil e como isso pode acontecer se o Tio Clive nunca autorizou ou permitiu.

Até lá.